Pesquisadores usam inteligência artificial no combate à fome

Solução criada na Universidade de São Paulo cruza dados automaticamente para apoiar a tomada de decisão mais eficaz contra a insegurança alimentar

O Centro de Inteligência Artificial (C4AI) da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveu uma ferramenta que pode ajudar a diminuir a gravidade das estatísticas da fome e da insegurança alimentar no país —que, juntas, afetam 136 milhões de brasileiros, segundo levantamento feito em 2020 pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan). 

A solução de inteligência artificial criada pelos pesquisadores brasileiros é capaz de identificar quais regiões de uma determinada cidade carecem de infraestrutura e de opções adequadas para o fornecimento de alimentos. Dessa forma, mostra para o poder público, empresas e ONGs onde e como agir para tomar decisões que resolvam ou minimizem a fome e a insegurança alimentar.

A solução, fruto de um projeto interdisciplinar da USP que ganhou vida com apenas 11 dias, analisa dados de diferentes bases para que seja possível identificar as localidades mais críticas e fazer outros tipos de análise. A integração de diferentes fontes é um problema crítico para um país tão grande quanto o Brasil; ao mesmo tempo, é fundamental para encontrar uma solução.

“Agora, com a nossa solução que cruza as informações de forma automática, a Inteligência Artificial apresenta as localidades mais críticas e diversos outros tipos de análises”, disse ao Jornal da USP Alexandre Delbem, criador da tecnologia e professor do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos (SP), e pesquisador do C4AI.

Ele explica que a tecnologia pode mapear diferentes áreas e se moldar a outros tantos tipos de informação. Isso significa que a solução de IA criada pela USP se adapta aos dados e descobre sozinha como o cruzamento pode ser feito para que eles se complementem e, assim, apoiem uma tomada de decisão. Não é preciso nem fazer um tratamento desses dados. “A inteligência artificial interpreta e apresenta resultados e previsões em relatórios, planilhas, gráficos ou mapas”, explica Delbem.

A experiência em São Paulo

Essa adaptabilidade permite que a solução trabalhe com qualquer tipo de dado, podendo ainda reunir informações a respeito do clima e prever possíveis desabastecimentos. Também pode facilitar a comunicação entre profissionais de diferentes áreas que tratem do mesmo assunto. Ou seja, gestores públicos podem trocar informações para que juntos consigam pensar em ações de combate à fome. 

“Tem fome por falta de alimento, fome de quantidade, fome de qualidade, fome por falta de acesso, por falta de nutrientes, fome porque não teve produção naquele ano. As informações de cada uma dessas áreas estão em bancos diferentes. São dados geográficos, sanitários, médicos e cada um deles representa um mundo distinto. A integração era um obstáculo enorme, mas que estamos resolvendo”, disse Antonio Mauro Saraiva, da Escola Politécnica da USP e pesquisador do C4AI.

A prova de conceito dessa solução foi realizada em São Paulo (SP) para identificar as regiões mais propensas à fome. Para isso, a IA usou três fontes de dados: o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e a indústria de alimentos (estabelecimentos que vendem comida na região).

Ao UOL, Saraiva explicou que há uma correlação entre o número de feiras livres, o número de estabelecimentos que vendem produtos in natura e o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social, que identifica locais em que predominam pessoas que estão à margem da sociedade. “Dessa forma,pode-se mostrar aos gestores públicos a situação de determinada região e pensar em planos de ação e políticas públicas”, disse ele.

O próximo passo do projeto é expandir o mapeamento para outras localidades e levar a solução para gestores públicos, ONGs e empresas para buscar soluções para esse problema que atinge 64% da nossa população. “A tomada de decisão é do governo, e isso precisa ser feito com base em ciência e dados”, disse Saraiva.

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